No crepúsculo tênue de uma terça-feira outonal, eis-me aqui, na
penumbra daquela cafeteria, onde os sorrisos se misturam aos murmúrios das
horas que escorrem preguiçosas. Um cliente solitário, peregrino da tarde, ergue
sua taça de espumante como um brinde à liberdade que se espraia pelos minutos
mansos.
Que enigma é este, contemplar um homem a saborear a efervescência
da vida em sua taça flute em pleno acaso do dia útil? A inveja se insinua, como
uma sombra furtiva, ao testemunhar tal dança solitária com o tempo, esse senhor
implacável que governa nossas existências.
E eu, mero espectador deste teatro mundano, me vejo enredado em um
breve intervalo de não mais que um quarto de hora, quando as obrigações se
calam e o relógio desacelera seu tic-tac incessante. Ah, que luxo é este? Permitir-se
perder-se nos devaneios de uma tarde vadia, sem a tirania das demandas urgentes
que nos afogam na rotina.
Meus olhos, ávidos por enredos, vagueiam pelas mesas e seus
ocupantes. Alguns, dominados por seus deveres, escravos dos compromissos que os
mantêm presos em suas demandas incessantes. Outros, mais serenos, desfrutam da doçura
do tempo, como quatro senhoras que tecem histórias entre xícaras de chá e
pedaços de bolo, mesmo que em luta com o próprio tempo.
Há ainda aqueles que flertam com o efêmero, seduzidos pelas
miragens da companhia, pelas páginas amareladas de um livro ainda não lido, ou
pelo desfilar de belas figuras por entre as mesas. E há aqueles que
simplesmente existem, entre olhares perdidos e suspiros contidos, testemunhando
o brilho na tela do celular ou o vaivém da vida que se desenrola para além das
janelas na avenida movimentada.
No final das contas, quem são estes viajantes do tempo, cujos
destinos se entrelaçam brevemente neste refúgio de encontros e desencontros? Serão
felizes, ou apenas flaneurs à deriva em caminhos incertos?
Ah, quem poderá decifrar os enigmas do espumante tardio, cujo brilho efêmero ilumina os corações solitários na penumbra da tarde? Talvez, assim como as bolhas que sobem em sua taça, sejamos todos transitórios meteoros neste vasto firmamento chamado vida, brilhando por um instante antes de desaparecer na imensidão do tempo.