Os causos do “Taíde”: João Amaro e dona Benedita

De todos os causos até agora, só falamos de mono ou bi personagens, mas seria muita falha, faltar a polipersonalização de nossos causos, nossas crônicas pitorescas. 
Viveram na Grota dos Cardosos, João Amaro e dona Benedita. Ele gritador de leilões de primeira classe, lavrador dos bons, ela cujo nome já diz tudo, Benedita, talvez fosse hoje poderíamos cognomina-la "Benedita da Silva", pelo seu carisma, ideal e bela arte de conviver.
João Amaro e dona Benedita moravam entre seu Quinquim Amador e Flor de Almeida numa casa de pau a pique coberta por taquaras, nas paredes, onde o Anatório e Natalina pintavam garatujas quem encantavam a toda a gente. Zezé Amador havia sido seminarista e desistindo voltou para fazenda trazendo consigo duas batinas pretas as quais eram usadas pelos padres com um gorro na cabeça. 
Geralda Amador e Maria de Quintina mas tarde Maria de Sebastião Chaves, sabendo da fé, do entusiasmo e dos cuidados de dona Benedita e de Natalina, combinaram em fazer uma brincadeira com as devotas pretinhas. 
Vestiram-se de Padre e irmã de caridade, mandaram o Zé Caranguejo na frente para avisar: "Dona Binidita, chegou no seu Quinquim um padre e uma irmã e tão vindo visita a sinhora". As duas quase se enlouqueceram: corre daqui, varre dali, tira picumá, limpa a fumaça dos quadros, e foi aquele bá-fá-fá danado.
Quando olharam, já vinham o padre e a irmã de caridade. Geralda Amador o padre e Maria de Quintina irmã. Cabeças baixas, disfarçando tudo, segurando para não rir. Quando chegaram à porta, dona Benedita de joelhos e mãos postas elevadas aos céus, proclamou em voz alta: "louvado seja nosso Senho Jesus Cristo! Benedito o que vem em nome do Senhor". Seu padre quero fazer com o Senhor uma confissão; eu e o Juão tamo brigados, essa noite nós durmiu separado, seu padre pruque ele pegou um xuxo e me deu uma xuxada que quase me matou, aí eu deixei ele duimi no jirau e eu passei a noite com a Natalina, o Senhor me perdoa padre?! E quando ia beijar as mãos ungidas do padre ao levantar os olhos, com aquele  rosto tímido, deparou-se com a Geralda Amador disparada na risada mais a Maria, que ao receber um abraço caloroso da dona Benedita proferiu: "Só assim minhas filhas que esta pobre preta pode ter a visita de dois reverendos. Mas valeu, arregaça as "batina", sente nos cepo que Anatório e Natalina vão passar cana no "iscassadô" e o cafezinho de garapa vai sê raspe e num vai farta o bolinho de caratinga com secas e mecas. Para aquela família, foi o maior presente dos falsos reverendos.

Os causos do "Taíde" / O Caminho, ano I - Edição 10 - Pág.: 03 - Coluna / MG - Novembro 2009

Os causos do “Taíde”: Geraldo Vaqueiro

"Habitua-se a conviver com a vida, sabendo que seus caminhos são muito mais de espinhos do que de flores" (Comece o dia feliz).
E falando em convivência de vida me lembrei dos nossos vaqueiros, homens destemidos, cheios de disposições, que levantam cedinho e vão para o pasto em busca das acas enquanto os bezerros saudosos berram e almejam a chegada da mamãe que desce do alto com o úbere pesado de leite para a aliviada ordenha.
Tínhamos em Coluna, Geraldo Severino da Silva, conhecido por todos domo Geraldo Vaqueiro. Chapéu de couro acabanado, pé pro mato, andado gingado demonstrando ser de fato um sertanejo sem mistura. Foi vaqueiro de seu Aguiar, Sebastião Freitas, Altivo Tavares, seu Getúlio Gonçalves e por fim, vaqueiro para Antônio Amador na Grota dos Cardosos. com o Geraldo era um vaqueiro simplório, o Antônio Amador ficava ali por perto da coberta para apreciar as suas mancadas (gafes).
Aconteceu uma enorme crise de tudo, devido a um forte veranico de janeiro, fevereiro e parte do mês de março, nada era encontrado: feijão, arroz, toucinho, fubá quase não se via. Toucinho, comprava-se um libra e com ela passava-se uma semana. O arroz deu uma crise no Acre e no estado do Maranhão e arroz nem pensar.

O Geraldo ficava com aquilo na cabeça, só pensava na crise: como é que vou tratar dos meus filhos? Falava sozinho em manhã, sol forte, ele foi ao pasto buscar as vacas e o garrote veio no meio e entraram para a coberta. O preocupado vaqueiro, peou a vaca, buscou o banquinho para tirar o leite mas ao invés de sentar-se debaixo da vaca, sentou-se debaixo do garrote, que ao sentir as mãos no seu dolorido saco, deu um forte pulo, coices e rabanadas.
Antônio Amador que assistia a cena disse: O que é isto Geraldo? Você peia a vaca e vai tirar leite no garrote? Vaca é vaca, garrote é garrote! Que bagunça é essa? "É a crise Tôin, é o preço do arroize, a falta da gordura, a casa vazia e os minino passano farata!".
E o garrote com os testículos doendo, com o rabo do olho mirava o Geraldo, e se os animais falassem, talvez ele diria assim: seu vaqueiro, filho de uma rabo aparado, vai tirar leite na comadre da sua madrinha.

Os Causos do "Taíde" / O Caminho, ano I - Edição 12 - Pág.: 03 - Coluna/MG - Janeiro 2010


Imagem: tirandoleite http://goo.gl/fOjqt

Os causos do “Taíde”: Maria Leandro

Foi lá pelas bandas do Bom Sucesso quando uma crise violenta nos finais do governo Artur Bernardes e início do de Washington Luiz que nasceu Maria, para mais tarde ser registrada por seu Lopes escrivão, Maria Leandro Pinto. Maria foi criada ali na roça desde novinha, enfrentando a dura lida naquele tempo de sol a sol. Não teve oportunidades de frequentar escolas, pois era tudo muito difícil, mas seus pais a educaram na fé, na esperança e no amor. Como sempre as zeladoras da igreja, Tereza Quintino, Geralda Tatão, Mariinha e outras sempre entravam em turbilhões com o Padre Sady. Dona Petrina do Juca Lemes arranjou a Maria Leandro para assessorar o padre. Com pouco tempo, passaram a chamá-la Maria do Padre. Chega alguém: "Padre, a Maria do Padre está ai? Aqui não tem nenhuma Maria do Padre não meu caro, tem Maria Leandro!

Certa ocasião, uma cascavel picou a Maria numa moita de banana prata, ela matou a cobra e na ponta do pau a levou para o Padre Sady: "Este bicho me mordeu padre". "Ah Dona Maria, vamos ao hospital". Ao chegar com a cascavel na ponta do pau o Dr. Saint Clair disse: "É isso mesmo que se faz padre! O senhor mata a cobra e mostra o pau!" E o Padre Sady: "Ah! Meu caro, o certo é mostrar a cobra!

É Maria Leandro, a Maria das Chaves, Maria dos Sinos, Maria das campanhistas, Maria das Flores, Maria do fuso fiadora de linhas do nosso algodão. Dia 20 próximo passado, ela completou seus 81 anos. A comunidade mais ligada a ela almejou homenageá-la com uma festinha que coma presença de alguns parentes, compadres, afilhados e nós seus amigos festejamos por demais a felicidade da Maria. Não faltou violão, viola, vozes e o tradicional parabéns: "parabéns a você... o soprar da velinha..., com quem será que a Maria vai casar..., vai depender se..., vai querer..., "ele" aceitou, mas perguntou se a Maria aposentou?


Os causos de “Taíde” / O Caminho, ano I-Edição 03 - Pág.:04-Coluna/MG - Abril de 2009