Adeus ano Velho

Ele partiu sem peso,
como quem fecha um livro,
mas deixa o marcador.
1 de janeiro de 1987

Composição de um ano novo

O passado é um acorde repetido.
Presente: palavras afinadas no ritmo da vida.
O futuro? Canção que ainda não tocou.

O tempo é isso, uma música no modo repeat.
Entre letra e melodia, tudo começa de novo.

Na conta do tempo

No fim das contas
O tempo travesso
Tropeça na pressa

O viral do tempo

Tempo, notificação desliza,
Escapa antes do clique.
Vai-se ontem, surge o amanhã,
Vem o feed, segue o flow.

Relógios? Quase memes.
Amanhãs no planner,
Ontem guardado na nuvem.

E cá estamos on-line,
Um "carregando" sem fim,
Entre lives, likes, e telas.
O tempo ri: segue viral.

Entre tempos

Tempo escorre, escapa.
Passado se espreguiça,
Futuro salta sem chão.

Presente? 
Carregando...

Zero hora, tudo volta.
Fuso, confuso, tempo ri:
Vai, vem, entre tempos.

Escorre, escapa. 

Página no altar

Ela ficou, na frente do altar, parada. A palavra do sim, ela não ouviu; e o não, ah, esse ficou preso nos lábios do verso, que nunca veio.

No fundo da capela, o vento entrou e passou, levando tanto o perfume das flores quanto a poeira do chão. Ela, quieta, sussurrou: “lágrima tem hora, e essa não é”.

Pois que o verso foi mundo afora, sem deixar palavras nem rima. Ela ficou ali. Esperando o quê? Talvez o poema que não chegou, ou soneto não lido, o conto mal redigido. 

Só quando o recanto sagrado se esvaziou ela deu o primeiro passo. Não olhou para trás.

E eu, que a vi de longe, pensei: a página em branco compôs a história.