O Ponto no Centro do Círculo

Era uma manhã comum, ou deveria ser. O café esfriava na xícara enquanto eu girava a colher em círculos, assistindo ao movimento da espuma se dissipar lentamente. O mundo ao redor seguia seu ritmo previsível, passos apressados na calçada, conversas murmuradas, mensagens piscando na tela do celular. Tudo parecia se mover dentro de um ciclo sem fim.

Mas havia algo naquela manhã que não se encaixava.

No canto da mesa, um guardanapo rabiscado, esquecido, exibia um círculo com um ponto no centro. Um símbolo simples, mas inquietante. Passei os dedos sobre o desenho, sentindo a textura do papel, foi como se aquilo contivesse um um mistério, um augusto segredo, que eu já conhecesse, mas nunca antes decifrara.

O ponto era um começo ou um fim? O círculo o protegia ou o aprisionava?

Peguei o lápis e redesenhei aquele traço com mais precisão. O ponto fixo no meio da curva perfeita, a forma mais simples e, ao mesmo tempo, a mais completa e complexa: justa e perfeita. Pensei no que ele poderia significar: o homem no centro da criação, a busca pelo conhecimento, o equilíbrio entre ordem e caos, a iniciação. 

E então, me ocorreu: quantos de nós passamos a vida sem nunca tocar esse centro?

Nos movemos todos os dias dentro de limites invisíveis: obrigações, rotinas, expectativas. Repetimos gestos, toques e palavras, giramos em torno de ideias conhecidas, sem jamais ousar atravessar a fronteira do círculo. Como se tivéssemos preparo suficiente para encarar o que há no meio, o mistério silencioso que espera.

Olhei ao redor. As pessoas seguiam suas trajetórias,marchas, inconscientes do símbolo ali diante de mim. O centro não é um limite, mas um portal.

Talvez seja esse o verdadeiro trabalho: encontrar o ponto, reconhecer sua presença e saber que ele sempre esteve lá. O caminho não está fora, mas dentro.

Terminei o café, dobrei o guardanapo e o guardei no bolso.

O mundo continuava o mesmo. Mas agora, eu sabia.

O círculo protege, mas o ponto chama.